“Treze de maio traição, liberdade sem asas e fome sem pão” Oliveira Silveira, 1970.
É comum que o dia 20 de novembro venha à tona quando tratamos do tema consciência negra dentro da comunidade escolar, pois além de ser uma data idealizada pelo grupo palmares junto ao Movimento Negro Unificado brasileiro, é também citada na Lei 10.639/03: “O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’ ”.
É possível que surja o questionamento da comunidade escolar do porquê não o dia 13 de maio, também instituído data comemorativa nacional, para que seja debatido questões raciais, uma vez que é justamente a data de abolição da escravatura. Para dar uma resposta consistente é necessário uma viagem histórica para o contexto de abolição e dos significados que a lei Áurea carrega.
O processo que levou ao fim da escravidão foi longo e data de toda a fase escravista brasileira, pois movimentos de resistência dos escravizados existiam desde o Brasil Colônia e devem ser lidos como um dos pontos que mais pesaram no processo de abolição.
No campo jurídico já haviam sido publicadas diversas leis que visavam terminar com a escravidão. A lei Eusébio de Queirós determinava o fim do tráfico negreiro (chamado pelos pretos de tráfico tumbeiro) e foi promulgada em 1850. Depois de seu surgimento, tráficos clandestinos brotaram a torto e à direita e a venda de escravizados entre províncias também.
Em 1871 a Lei do Ventre Livre foi promulgada e previa que a partir daquele momento todas as crianças nascidas de escravizadas eram livres. Como uma manobra política, é criada, assim como a Eusébio de Queirós, com a intenção de acabar com a escravidão de forma gradual e com indenização apenas aos donos de escravizados.
Antes mesmo do 13 de maio de 1888 a província do Ceará, em 1884, havia decretado o fim da escravidão por meio de uma revolta popular organizada pelo movimento abolicionista cearense e liderada por um negro livre conhecido como Dragão do Mar.
Já a Lei Áurea, assinada em 1888 pela princesa Isabel, foi uma lei que libertou, mas não trouxe igualdade e nem condições básicas de sobrevivência para os libertos, como acesso a moradia, saúde, educação e alimentação dignas. Além disso, ela passa a visão errada de que a liberdade foi um presente concedido pela família imperial, sem nenhum envolvimento popular dos próprios pretos.
Para mais detalhes desses eventos históricos, acesse os hiperlinks do infográfico abaixo:
Nenhuma dessas leis foi efetiva e serviam apenas para tentar frear a abolição, evitar uma guerra civil (como a que ocorreu nos Estados Unidos) e fugir de uma rebelião generalizada de escravizados (a exemplo do Haiti).
Com a proximidade da abolição os senhores de escravizados exigiam jornadas mais pesadas, em um sistema que nunca foi leve. Como resposta, o aumento de fugas e os ataques e assassinatos contra fazendeiros se tornou constante, além dos protestos de populares e forros. Esses atos sim representam as causas da abolição e podem ser lidos como processos de resistência.
Fruto da resposta frente a piora gradual do sistema escravista, os refúgios para pretos que fugiam eram verdadeiras comunidades subsistentes de trabalho comunitário, poder militar forte e sistemas de organização política semelhantes às de alguns grupos étnicos africanos. Além disso, era lugar de expressão livre da religiosidade e cultura de origem dos povos escravizados. Os quilombos enfureceram os donos de escravizados justamente por representar uma grande subversão ao sistema escravista. Os quilombos ainda hoje são símbolos de resistência e você pode saber mais sobre eles no Observatório Quilombola.
Como exemplo, é possível citar o Quilombo do Leblon, um quilombo simbólico, mas que carrega a origem da simbologia das camélias. A chácara servia de espaço de ajuda para os fugitivos com a cooperação dos abolicionistas. Nesse local eram cultivadas flores com o auxílio dos pretos. Essas flores eram as camélias, ainda raras no Brasil, e se tornaram o símbolo do movimento abolicionista.
Você pode saber mais sobre a história do Quilombo dos Palmares por meio do HQ (história em quadrinhos) Angola Janga – uma história de Palmares, de Marcelo D’Salete, um ótimo material para uso pedagógico:
O dia 20 de novembro é considerado o dia de morte de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos palmares, e simboliza para o movimento negro a real importância de se ter um dia da consciência negra.
Por que é importante tratar das falhas da Lei áurea com os estudantes da educação básica? Fique ligado no próximo post que vamos falar sobre isso!
Habilidades mobilizadas (BNCC):
- EF09HI04 Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.
- EF08HI19 Formular questionamentos sobre o legado da escravidão nas Américas, com base na seleção e consulta de fontes de diferentes naturezas.
- EF04GE06 Identificar e descrever territórios étnico-culturais existentes no Brasil, tais como terras indígenas e de comunidades remanescentes de quilombos, reconhecendo a legitimidade da demarcação desses territórios
- EF07GE03 Selecionar argumentos que reconheçam as territorialidades dos povos indígenas originários, das comunidades remanescentes de quilombos, de povos das florestas e do cerrado, de ribeirinhos e caiçaras, entre outros grupos sociais do campo e da cidade, como direitos legais dessas comunidades.
*Texto escrito em parceria entre: Equipe Assessoria de História e Ensino Religioso e a Professora Daniela Pereira da Silva.
Assessoria para Educação das Relações Étnico Raciais – ERER.
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Referências:
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC/SEB, 2017. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/uploads/2018/02/bncc-20dez-site.pdf>. Acesso em: maio de 2021.
_________. Lei nº. 10.639 de 09 de janeiro de 2003. Inclui a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-brasileira” no currículo oficial da rede de ensino. Diário Oficial da União, Brasília, 2003.
CERRI, Luis Fernando; JANZ, Rubia Caroline. Articulação entre passado e presente a partir da compreensão do 13 de maio e do 20 de novembro por estudantes. Diálogos-Revista do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História, v. 21, n. 2, p. 99-112, 2017.
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia: Com novo pós-escrito. Editora Companhia das Letras, 2015.