A Semana da Consciência Negra é um momento potente para refletirmos sobre a presença da cultura afro-brasileira em nossas escolas. Mas, antes de tudo, é importante lembrar: não se trata de uma data comemorativa, e sim de um convite à reflexão, ao reconhecimento e à valorização de uma história muitas vezes silenciada.
Durante as aulas de Arte, é o momento de expandir repertórios, promover o diálogo e combater estereótipos, não de os reforçar.
Então, escrevi algumas dicas para acertarmos da melhor forma possível!
O que devemos evitar
Algumas práticas, ainda comuns nas escolas, acabam reforçando visões racistas, mesmo que de forma não intencional. Veja alguns exemplos do que não fazer:
Não pintar o rosto das crianças de preto (blackface):
Essa prática tem origem em um contexto racista e reforça estereótipos ofensivos. O respeito à representatividade começa pela escuta e pelo conhecimento, não pela caricatura.
“Somos todos iguais”:
É muito comum ver cartazes na escola com a frase “somos todos iguais”. Apesar de buscar unidade, essa frase se torna problemática, afinal somos todos iguais? Não, não somos! Cada um de nós tem sua especificidade, dilema e história. Cada pessoa passa por coisas que constroem sua personalidade e moldam seus próprios caminhos, e dizer que somos todos iguais acaba anulando essa trajetória. Por isso, valorize as diferenças, é isso que constitui a escola e a cultura.
Evitar atividades que “folclorizem” a cultura africana:
Reduzir o continente africano a danças, batuques e fantasias exóticas empobrece sua riqueza cultural. A África é um continente plural, com histórias, filosofias, produções artísticas e tradições milenares.
Evitar retratar personagens negros apenas como escravizados ou subalternos:
Trabalhar apenas a escravidão apaga outras narrativas possíveis: reis e rainhas africanos, artistas, pensadores, inventores, líderes e criadores.
Evitar “enfeitar” a escola sem um sentido pedagógico:
Mural bonito não é sinônimo de consciência. É preciso contexto, reflexão e diálogo.
O que fazer: caminhos potentes para a Arte-Educação
A arte pode ser uma ferramenta poderosa de emancipação e reconstrução de narrativas. Aqui vão algumas propostas de atividades significativas:
Estudo de artistas afro-brasileiros e africanos:
Explore a produção de artistas como Abdias Nascimento, Rosana Paulino, Emanoel Araújo, Rubem Valentim, Sonia Gomes, Dalton Paula, entre outros.
Atividade sugerida: Apresente obras e incentive os alunos a criarem produções inspiradas nesses artistas, refletindo sobre identidade e ancestralidade.
Por exemplo: Emanoel Araújo tem um forte trabalho com esculturas que se originam de elementos da cultura iorubá e do povo tchokwe. Após falar sobre a importância do artista para a cultura afro-brasileira, podemos propor aos estudantes que façam suas esculturas inspiradas no artista, com papelão ou com folhas de sulfite.
Este link contém informações sobre o trabalho do artista: https://fcs.mg.gov.br/emanoel-araujo-arte-e-combate-ao-racismo/.
Outro exemplo que podemos abordar com os estudantes mais velhos é a questão da narrativa visual a partir do lugar de fala, e a artista essencial para isso pode ser a Rosana Paulino. Aqui você encontra um link para saber mais sobre ela e suas obras: https://arteref.com/arte-contemporanea/rosana-paulino-biografia-e-trajetoria/. A atividade pode ser um painel coletivo sobre o apagamento de histórias de personalidades negras ou um bordado em fotos e imagens de pessoas pretas, com o mesmo intuito da artista (simbolizar o silenciamento do povo negro). O bordado pode ser substituído por uma costura simples e o pano, por imagens de revista.
Leituras de imagens e rodas de conversa sobre representatividade:
Analise obras que representem corpos negros e discuta: Como são retratados? Quais sentimentos despertam? Que histórias essas imagens contam?
Você pode, junto aos estudantes, criar uma tabela, painel ou cartaz com todos os nomes de personalidades negras que os alunos conhecem, depois façam pesquisas para aumentar o repertório acerca de outros artistas. O objetivo principal é ampliar o repertório dos estudantes e, ao final, comparar os cartazes de antes e depois dessa mediação.
Criação de autorretratos afirmativos:
Convide os alunos a se retratarem destacando sua beleza, ancestralidade e força. Trabalhe com colagem, pintura ou fotografia, discutindo autoestima e identidade.
Mas, atenção, cuide para que eles não caiam nos estereótipos!
Integração entre música, dança e visualidade afro-brasileira
Explore o maracatu, o afoxé, o samba de roda, o jongo e o hip-hop como expressões culturais de resistência e arte.
É possível criar uma instalação visual que dialogue com os ritmos e movimentos dessas manifestações.
Produção coletiva sobre heranças africanas:
Monte uma exposição, mural ou vídeo colaborativo mostrando como a presença africana se manifesta na culinária, na arte, na moda, na arquitetura e na linguagem.
Mais que uma semana, um compromisso permanente
A consciência negra não deve ser um tema pontual em novembro, mas uma presença contínua no currículo e na prática pedagógicos.
Trabalhar com arte é também trabalhar com memória, corpo, voz e identidade.
Que cada proposta ajude a construir uma escola que não apenas reconhece, mas também celebra a diversidade e o protagonismo negros.
Para se aprofundar
- Documentário: Orí (dir. Raquel Gerber e Beatriz Nascimento)
Gostou? Ficou com dúvidas ou tem sugestões? Escreva para mim!
Até a próxima! =)
Rafael Pawlina – Assessor de Arte






